As imagens são corriqueiras na internet: elefantes com panos coloridos sobre o dorso, equipados com assentos de bambu, sombrinhas típicas e… turistas! Sim, viajantes do mundo todo pagam para passear de – e alimentar e tomar banho com – elefantes cativos. Sem falar nos shows deprimentes em que os animais sentam em banquinhos, se equililbram sobre as patas traseiras e cumprimentam visitantes com a tromba. Como se fossem animais de estimação. Em nossa peregrinação pelo Camboja, fizemos questão de incluir uma visita a elefantes. Fomos, porém, a um santuário que se dedica a fazer o contrário: resgatar animais cativos e devolvê-los ao habitat natural. Neste post, vamos enumerar 5 razões para jamais montar elefantes.
Antes, porém, vamos entender a importância dos paquidermes no Sudeste Asiático, ao mesmo tempo em que você acompanha o passeio pelas galerias de fotos.
Elefantes no Sudeste Asiático
Os elefantes têm importância sobretudo cultural e simbólica na história do Camboja. Historiadores e arqueólogos acreditam que mais de 12.000 desses animais, por exemplo, trabalharam na construção do complexo de templos de Angkor Wat, em Siem Reap.
Vamos falar desses templos no próximo post. Por enquanto, podemos adiantar que se trata do mais antigo complexo religioso da humanidade. Patrimônio tombado pela Unesco.
Além da construção civil, os elefantes eram armas de guerra do império do Khmer, entre os séculos 9 e 15. O exército do Khmer, portanto, impunha respeito com sua força em elefantes de batalha.
Registros históricos
Em tempos de paz, porém, os elefantes trabalhavam no campo e na construção. Nos desfiles da nobreza, conferiam status aos nobres que os montavam.
Parte considerável do que se sabe sobre o papel dos elefantes vem das esculturas registradas nos afrescos de Angkor Wat. Muitos conhecimentos, porém, vieram de relatos antigos feitos por árabes e chineses que visitaram o Império Khmer.
Símbolo religioso
Dessa forma, os animais se tornaram parte integrante da cultura e da religiosidade local. O povo Bunong que habita o Mondulkiry Valley acredita, por exemplo, que os elefantes têm ligação com os espíritos da natureza.
No Hinduísmo, religião predominante durante o império Khmer, Ganesha tem cabeça de elefante. É o deus que remove obstáculos.
População em declínio
A longa exposição aos humanos levou ao declínio das populações de elefantes. Das imensas hordas que anteriormente existiam no Camboja, restam hoje entre 400 e 600. Desses, 75 vivam em cativeiro.
O problema, porém, não ocorre só no Camboja. A União Internacional para Conservação da Natureza inclui a espécie Elephas Maximus em sua Lista Vermelha e estima que existam em todo o continente menos de 50 mil animais em habitat natural.
O elefante asiático, portanto, está em risco de extinção em toda a Ásia.
Antes de prosseguir com as 5 razões para jamais montar um elefante, confira um resumo em vídeo do nosso encontro com os elefantes:
Os motivos para o declínio
Não existe um fator único para a queda no número de animais, mas uma combinação de causas:
– Uso para o turismo – Para atender sobretudo a demanda turística, os animais vão para o cativeiro. A procriação nesse ambiente, porém, é difícil e custosa. Quando o animal morre, o dono captura outro na natureza para substituí-lo.
– Longa guerra civil – Assim como os humanos, os elefantes sofreram com bombardeios e minas terrestres durantes os 20 anos de guerras na região.
– Redução do habitat natural – A velocidade do desenvolvimento imobiliário no Camboja no pós-guerra causou a derrubada de florestas em velocidade vertiginosa. Elefantes selvagens precisam de largas áreas para circular e se alimentar de vegetação.
– Tráfico de marfim – Caçadores ilegais continuam exterminando elefantes para vender o marfim das presas.
O Elephant Valley Project
Desde 2006, uma organização não governamental sem fins lucrativos trabalha na região do Vale do Mondulkiri para promover a libertação e readaptação dos elefantes ao habitat natural. Com 1.500 hectares de florestas, o projeto arrenda animais que trabalham na agricultura para famílias do povo Bunong. A família assina um contrato de cessão, entrega o paquiderme e recebe pagamento pela cessão.
Doações e passeios turísticos pagam os custos do programa. Turistas como nós, que procuram o EVP para uma experiência autêntica com animais em seu habitat natural, ajudam a sustentar o projeto. O modelo gera empregos e diminui a vulnerabilidade de 2 mil pessoas na região.
Sem montaria, nem banho
No EVP, ninguém monta nos elefantes, nem alimenta ou toma banho com os animais. No passeio que fizemos, nos embrenhamos na mata e caminhamos por cerca de 1 hora antes de encontrar duas fêmeas que normalmente andam juntas pela floresta.
Nosso guia, Kherl Touern, é membro do povo Bunong e trabalha há 10 anos no EVP. Ele explicou que Ning Wan, as mais velha das duas fêmeas, tem 65 anos e perdeu os dentes quando vivia em cativeiro. Por isso, precisa ser alimentada pela equipe do projeto.
Gee Chreng, a companheira inseparável dela, tem 60 anos. Com peso estimado em 2 toneladas cada, elas passam 16 horas por dia comendo e podem consumir até 200 kg de alimento nesse prazo.
Antes de seguirmos para 5 razões para jamais montar elefantes, confira as fotos do momento do passeio em que, inspirados pelos elefantes, atacamos o almoço do acampamento-base:
Finalmente, as 5 razões para jamais montar elefantes
1. Restrição da liberdade – Para que possa se acostumar com humanos, o elefante tem que ser tirado de seu habitat natural e domado. Daí em diante, não poderá mais pastar livremente pela floresta, porque precisa estar à disposição dos turistas. Isso significa que ele ficará confinado, muitas vezes acorrentado durante a noite.
2. Dieta deficiente – Animas cativos precisam ser alimentados por seus donos. Como comem o equivalente a até 7% de seu peso corporal por dia e um macho adulto pode pesar até 4 toneladas, o custo é alto. Invariavelmente, o dono acaba negligenciando a dieta.
3. Maus tratos – O fato de você estar feliz em cima do elefante, especialmente com a foto que vai postar no Instagram, não significa que o animal esteja feliz em carregá-lo. Como elefantes não podem ser domesticados, os treinadores precisam domar o animal. Geralmente eles apelam para métodos cruéis e violentos. Além disso, as cadeirinhas usadas para acomodar os turistas causam ferimentos na pele.
4. Calor excessivo e desidratação – O animal usado para trabalho turístico não pode circular livremente a procura de água. Além disso, é impedido de jogar terra sobre as costas como faz na natureza. Esse hábito é uma forma de proteger a pele dos raios solares. Sem essa proteção, o elefante sofre com o calor excessivo.
5. Turismo responsável – Por mais que você esteja pensando nas fotos do Instagram, pese esses fatores antes de optar por passeios que oferecem transporte nas costas do elefante e também o banho com o animal. Seja um turista responsável e direcione seu dinheiro para projetos que protegem os animais e evitam a exploração. Contribua para a perpetuação da espécie, não para extinção.
Planeje a sua viagem
- O Vale do Mondulkiry fica 360 quilômetros a Nordeste de Phnom Penh, na fronteira com o Vietnã. A cidade maior na região é Sen Monorom. Ela vai ganhar um aeroporto em 2025, mas por enquanto o acesso é por terra.
- Ônibus noturnos com camas fazem a viagem em cerca de 7 horas.
- O inglês não é uma língua consolidada entre motoristas de tuk-tuk em Sen Monorom. Eles compensam a dificuldade na simpatia. Bun Sareoun, que nos pegou na estação de ônibus, une as duas habilidades. Fala bom inglês e tem ótimo astral. O telefone dele é +855 88 544 9299. Atende pelo WhatsApp.
- Uma boa pedida para comer em Sen Monorom é a Route 76 Guest House. Mantida pelo italiano Andrea Torim, serve massas e pizzas artesanais, feitas com ingredientes importados da Itália.
- A Route 76 também tem quartos para hóspedes, em acomodações simples. Não tem site próprio, mas é possível fazer reservas pelos sites de reservas. O telefone é +855 16 283 300.
- O Elephant Valley Project oferece diversas modalidades de turismo, de passeios de observação de meio dia a três dias e duas noites de imersão completa, com hospedagem no acampamento-base.
- Se você for muito apaixonado por elefantes, pode se voluntariar para passar duas semanas trabalhando no local.
Comments
6 respostas para “5 razões para jamais montar elefantes”
[…] de tanta imersão nas florestas dos elefantes e nos templos antigos do Império Khmer, os meninos estavam sobretudo ávidos por um pouco de […]
[…] de mais uma noite chacoalhando no ônibus cama que nos trouxe de Sem Monorom, trocamos de veículo em Phnom Penh. Não tivemos muito tempo para descanso, porque emendamos mais […]
O que vocês comeram naquele almoço? Não consegui identificar nada! O que são aqueles ovos espetadinhos?
Estou adorando o desnorteando. Suas histórias são sempre muito boas.
Oi, Maria José! Obrigado por prestigiar o site! Indique para os amigos. Bom, sobre o almoço: tinha bastante arroz, que aqui na Ásia é o pão-nosso de cada dia :), e três opções de curries: um com carne vermelha, um com frango e um com tofu e legumes. A mesa ao lado era das frutas. Tinha abacaxi, uma muito parecida com a romã, aquela vermelha no primeiro plano na foto é a pitaya, que aqui eles chamam de fruta do dragão, e o “ovo espetadinho”, na verdade, é uma espécie de lichía.
Aprendi muito!!! Não fazia ideia da importância histórica dos elefantes nesta região. Muito bons também os argumentos para não montá-los. Fazer turismo com consciência é isso, buscar atitudes éticas e responsáveis onde quer que se vá. Parabéns pra essa família linda.
Obrigado, Sheila! Nós também aprendemos sobre os elefantes só agora. No fim, isso é o que a gente leva das viagens, né? O que a gente aprende com as experiências. É uma pena que, cada vez mais, as pessoas estejam interessadas apenas em levar as fotos que postam no Instagram. Uma das missões do DESNORTEANDO é despertar a consciência para a importância de sair da Egotrip de postar tudo no Instagram para viver a viagem verdadeiramente.