Mais de um mês em Bali e ainda tenho dificuldade de afivelar meu capacete. Quer ajuda, ibu? O motorista do Gojek (mototáxi) respeitosamente ajusta a tira no meu pescoço, trava o fecho e escorrega seu corpo para a frente do banco, abrindo espaço para que eu sente sem aperto na garupa. A moto acelera e o vento no rosto me traz aquela sensação de liberdade que o movimento sempre provoca em mim.
Fico imaginando aquele reel da turista desbravando a cidade em cima da moto… Born to be Wild na trilha sonora e hashtag #viajanteindependente. Não, péra. Mas aí não posso contar que minutos antes eu não conseguia fechar meu próprio capacete. Nem posso falar de como aquele trânsito caótico me assusta, e de como prefiro estar na garupa do que na direção.
Minha memória me leva a 20 anos atrás, quando dois caminhoneiros me ajudaram a atravessar o norte da Etiópia num momento em que eu me vi doente e sozinha. Volto um pouco mais e me lembro do dia em que perdi o último ônibus num povoado no meio do sertão cearense, e uma senhora do projeto que eu visitava pendurou uma rede a mais na sala da sua casa para que eu passasse a noite. Sem falar na carona que me arranjaram na manhã seguinte, no alto de um… caminhão pipa. E foram tantas as caronas que peguei nas minhas andanças pelo mundo… E muitos abrigos, almoços, conversas em misturas de línguas e gestos. Tanta sabedoria, cuidado e generosidade que recebi.
A moto segue costurando pelo trânsito caótico de Denpasar. Pelo retrovisor eu observo a expressão atenta do motorista e me sinto segura. Em boa companhia. E assim cai a ficha. Que bobagem essa coisa de #viajanteindependente. Se andei tanto mundo afora, é porque sempre encontrei uma mão estendida. E sempre confiei que ela estava ali com as melhores intenções. Porque no fundo acredito que o ser humano é bom e generoso. Como dizem os angolanos ao se despedirem, “tamo junto”.
Desço da moto, o motorista me ajuda soltar o capacete, estendo a mão em agradecimento. Matur suksma. Caminho até meu destino sentindo que levo o mundo todo junto comigo. É a interdependência que move a humanidade, pois nos leva ao encontro do outro. E as viagens são grandes oportunidades de vivenciarmos esses encontros. Pronto, hashtag atualizada. Daqui pra frente me defino como uma #viajanteinterdependente.
Se você também já viveu uma situação de inTERdependência nas suas viagens, conte aqui nos comentários. Bora lançar o movimento por mais conexão na estrada.
Leia também:
– Astungkara way e a tradição do arroz em Bali
Comments
Uma resposta para “As caronas que me levam e o mundo que levo comigo”
[…] – As caronas que me levam e o mundo que levo comigo […]