Eu sempre amei História. Era minha disciplina favorita na escola, foi minha segunda opção no vestibular. Encantam-me as narrativas sobre ascenção e queda dos impérios, os líderes e os vilões; acima de tudo, os hábitos cotidianos dos humanos que viveram antes de nós e moldaram nossa existência… Egípcios, Romanos, Gregos, Astecas, Maias, Incas, Khmers… Opa, Khmers? Eu, que pensava saber tanto sobre História, descobri afinal o tamanho da minha ignorância ao me deparar com o império esquecido em Siem Reap, 320 quilômetros a nordeste de Phnom Penh.
Sede do Parque Arqueológico de Angkor, Siem Reap é certamente o maior ponto turístico do Camboja. Parada obrigatória para quem visita o país. Por ali passa a história de um império poderoso que comandou o sudeste asiático por sete séculos. Um império que atraiu a curiosidade de potências da região como Índia e China, mas sobre o qual a maioria de nós, no ocidente, sabe absolutamente nada.
Um império esquecido. Um conjunto de templos e monumentos que ficou escondido pela natureza durante mais de três séculos.
É tanta história e tanta informação que decidi dividir nossa visita ao local em dois posts.
Neste, vou contar sobre nosso primeiro contato com os monumentos de Angkor, mas concentrarei o relato na nossa conexão com a charmosa cidade de Siem Reap. A parte histórica, portanto, ficará para a visita ao Angkor Wat, no próximo post.
No final de ambos você encontrará as habituais dicas práticas para planejar a sua viagem.
Ônibus e piscina
Depois de mais uma noite chacoalhando no ônibus cama que nos trouxe de Sem Monorom, trocamos de veículo em Phnom Penh. Não tivemos muito tempo para descanso, porque emendamos mais 320 quilômetros até Siem Reap. A antiga capital do Império Khmer é a porta de entrada para os impressionantes templos do complexo de Angkor.
Chegamos no início da tarde depois de uma viagem agradável numa linha da Vireak Buntham que tinha até serviço de bordo com almoço. Certamente algo inédito na vida de viajante.
Nós já havíamos planejado a visita aos templos para o dia seguinte. As entradas para o parque não são baratas. Nãp compensa, portanto, pagar ingresso de um dia para uma visita de final de tarde. Aproveitamos então para relaxar um pouco na piscina do hotel antes de seguimos para o Portão de Tonle Om, também conhecido como portão Sul do Parque de Angkor, para assistirmos ao por do sol.
Pôr do Sol no Portão de Tonle Om
A bordo de um possante tuk-tuk para quatro pessoas, nos dirigimos para o Portão de Tonle Om. Ali, então, travamos o primeiro contato com os monumentos do Parque Arqueológico de Angkor.
O Tonle Om é um dos cinco portões que dá acesso à cidadela de Angkor Thom. Trata-se de um complexo construído no século 12, todo murado e rodeado por um fosso alagado com 100 metros de largura.
Um passeio famoso, ali, é embarcar em gôndolas que levam os turistas pelo canal para presenciar o por do sol.
Nós, porém, não embarcamos em gôndolas. Assistimos ao espetáculo ao lado das 108 estátuas que guardam a ponte de acesso sobre o fosso.
Naga, Devas e Asuras
Em cada lado da ponte, 54 gigantes seguram o corpo de uma Naga, a serpente mítica de sete cabeças. Os gigantes do lado esquerdo de quem se dirige ao portão têm sorrisos nos lábios e olhos orientais. Representam os Devas, ou deuses. Os do lado direito têm olhos esbugalhados e estão fazendo caretas. Representam os Asuras, ou dêmonios.
Juntos, eles somam o número 108, sagrado no hinduísmo, e representam o eterno cabo de guerra entre bem e mal que gera a dinâmica da vida.
A abertura do portão é ladeada por seis cabeças de elefante – três de cada lado, e no alto um rosto masculino voltado para a ponte, é ladeado por dois rostos femininos.
Alguns acreditam se tratar de representações do rei Jayavarman VII e de suas duas rainhas, Indradevi e Jayarajadevi. Trata-se, porém, de uma suposição sem confirmação histórica.
A noite de Siem Reap
De volta do passeio histórico, engatamos um tour contemporâneo. Siem Reap nos surpreendeu com uma noite cheia de atividades. Num parque às margens do rio que leva o mesmo nome da cidade, por exemplo, grupos de moradores locais se reuniam em aulas de ginástica aeróbica ao ar livre. Muita música e barraquinhas de comida completavam o cenário.
Nessa primeira noite, como estávamos cansados das duas viagens norturnas a Sem Monorom, optamos por um jantar tranquilo num restaurante de comida local, o The Sugar Palm (link no quadro Planeje a sua viagem). Como se não bastasse o cansaço, precisaríamos acordar cedo para ver o sol nascer no templo de Angkor Wat.
Na noite seguinte circulamos um pouco pela ruas mais badaladas da noite de Siem Reap, mas sem extravagâncias. Na manhã seguinte, acordaríamos cedo novamente para encarar a estrada a caminho da Tailândia.
Comidinhas e turismo consciente
Uma das nossas bandeiras aqui no DESNORTEANDO é promover viagens regenerativas e transformadoras, que tragam benefícios não apenas ao viajante, mas também aos moradores do local turístico.
Antes de partirmos para o próximo post – onde estará a maior parte do que aprendemos com o império esquecido em Siem Reap –, vale mencionar um projeto muito interessante que encontramos na cidade: a Bayon Coffe Shop.
Instalada num charmoso jardim de um casarão colonial, a Bayon serve café da manhã, brunch e pratos de almoço. Seu prato principal, porém, é a educação de jovens mulheres cambojanas.
No Coffe Shop funciona uma escola profissionalizante que todos os anos ensina a arte da pastelaria e da padaria francesa a 20 jovens mulheres em situação de vulnerabilidade, criando novos horizontes de futuro. O projeto começou em 2014 e desde então formou 100 profissionais do ramo. Metade dos recursos necessários para a formação vem das receitas do próprio café, que além do atendimento no local, fornece doces e pães a 15 hotéis na região.
As jovens aprendizes recebem salário pelo trabalho, acomodações no casarão do projeto, uniformes e uma bicicleta para poder frequentar aulas em diferentes instalações. Os idealizadores escolheram trabalhar exclusivamente com mulheres porque elas são o público mais excluído das oportunidades de estudo no Camboja.
Planeje a sua viagem
- A viagem entre Phnom Penh e Siem Reap leva cerca de cinco horas.
- Várias companhias transportam passageiros nesse trecho e não há um rodoviária centralizada em Phnom Penh. Cada companhia tem o seu terminal próprio.
- Nós usamos os ônibus da Vireak Buntham Express. Os preços começam em 14 dólares por pessoa, mas variam muito, dependendo da data e do horário de viagem.
- Siem Reap é um ponto turístico bem desenvolvido, com opções de estadia para todos os bolsos. Das acomodações luxuosas em grifes estreladas como Park Hyatt e Marryott a opções mais acessíveis.
- Nós optamos por um hotel mais baratinho, o Boutique Indochine D’Angkor. O quarto era amplo, com uma cama de casal e duas de solteiro em dois ambientes separados. Não era maravilhoso, mas atendeu bem.
- A cidade também tem muitos restaurantes de nível internacional. A dica de uma amiga de Bali nos levou ao The Sugar Palm, que serve boa comida local por preços justos.
- Você sente falta de docinho no meio da tarde? As tortas e bolos do The Muffin Man foram um achado. Em dois dias na cidade, passamos lá duas vezes.
- Os doces da Bayon Coffe Shop também são maravilhosos. O valor pago, além de justo, ajuda a manter o projeto de formação das jovens cambojanas em padaria e pastelaria francesa.
Comments
Uma resposta para “O que aprendemos com o império esquecido em Siem Reap”
[…] você está chegando ao DESNORTEANDO só agora, é importante explicar: este post é continuação deste outro, escrito na semana passada. Recomendo, portanto, que você leia aquele primeiro. Lá eu conto mais sobre a nossa chegada a […]